Arquivo da categoria: Entomologia

Um superbesouro que não está nem aí para envenenamento por cianeto

por Piter Kehoma Boll

De forma a tentar evitar predadores, muitas espécies desenvolvem poderosas toxinas que prejudicariam qualquer um tentando comê-las, às vezes até matando. No entanto os predadores podem contra-atacar desenvolvendo uma forte resistência às defesas da presa, às vezes a níveis espetaculares.

Milípedes, ou piolhos-de-cobra, são conhecidos como presas de sabor desagradável que evoluíram uma variedade de toxinas para deter predadores. Não obstante, algumas espécies encontraram maneiras de lidar com as defesas dos milípedes, tornando as pobres criaturas desesperadas pelo desenvolvimento de novas estratégias de sobrevivência.

Na América do Norte, besouros carabídeos do gênero Promecognathus são predadores especialistas em milípedes. A espécie Xystocheir dissecta, uma de suas principais presas, produz cianeto como defesa química. Cianeto é um composto muito tóxico para a maioria das formas de vida.

O milípede produtor de cianeto Xystocheir dissecta. Foto do usuário mhertel do iNaturalist.*

Num estudo recente, 18 espécies diferentes de besouros carabídeos foram expostas a cianeto de sódio (NaCN) em laboratório para terem sua resistência verificada. Enquanto a maioria das espécies sucumbiu em menos de 10 minutos quanto exposta a 15 mg de NaCN ou menos, três espécies pouco se lixaram mesmo para quantidades tão altas quanto 100 mg. Estas três espécies são Promecognathus crassus, P. laevissimus e Metrius contractus. Enquanto as duas espécies de Promecognathus se alimentam de Xystocheir dissecta, Metrius contractus não o faz.

Promecognathus laevissimus, o besouro-“eu comeria cianeto no café”. Foto de Eddie Dunbar.*

Em outro experimento, as espécies foram expostas de 100 mg de cianeto de potássio (KCN) por até duas horas. Enquanto M. contractus permaneceu ativo durante a primeira hora, todos os espécimes sucumbiram em menos de duas horas, mas, após 120 min, alguns espécimes de Promecognathus laevissius ainda estavam andando por aí como se nada estivesse acontecendo.

Metrius contractus, resistindo ao cianeto só de zoa. Foto do usuário tparkeressig do iNaturalist.*

Este estudo é a primeira evidência de predadores resistentes a cianeto. Enquanto este superpoder em P. laevissimus é facilmente explicado pelo seu comportamento predatório, a alta resistência de M. contractus ainda é um mistério, já que esta espécime não é especializada em milípedes, apesar de ser possível que os coma como comida alternativa, especialmente espécimes doentes ou machucados. Ambas as espécies, no entanto, são resistentes a quantidades de cianeto bem acima do que eles encontrariam em qualquer milípede. É realmente um superpoder.

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Referência:

Weary BP, Will KW (2020) The Millipede-Predation Behavior of Promecognathus and Exceptional Cyanide Tolerance in Promecognathus and Metrius (Coleoptera: Carabidae). Annals of the Entomological Society of America. https://doi.org/10.1093/aesa/saaa023

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial 4.0 Internacional

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Arquivado em Comportamento, Ecologia, Entomologia, Evolução, Zoologia

Combatendo mosquitos Aedes com plantas carnívoras

por Piter Kehoma Boll

Dois mosquitos do gênero Aedes, Aedes aegypti e Aedes albopictus, são espécies invasoras em regiões tropicais e subtropicais a nível global. Enquanto A. aegypti é nativo da África, A. albopictus é originalmente do sudeste da Ásia, mas ambas as espécies foram disseminadas por humanos e continuam a expandir sua área de ocorrência.

As duas espécies são conhecidas como vetores de várias doenças que afetam humanos, especialmente aquelas causadas por espécies de Flavovirus, o que inclui febre amarela, dengue e zika. Chikungunya, causada por uma espécie de Alphavirus, também é transmitida a humanos por eles. Além disso, eles também podem transmitir alguns nematódeos, como o verme-do-coração que infecta o coração de cães e outros carnívoros.

Aedes aegypti picando um humano e tendo uma deliciosa e sangrenta refeição. Foto de James Gathany.

Por A. aegypti e A. albopictus serem uma ameaça tão grande à saúde pública, se livrar deles é prioridade. Aqui no Brasil, há uma campanha nacional massiva para reduzir a habilidade de Aedes de se reproduzir. Para isso, recomenda-se evitar recipientes com água parada em locais abertos, tal como vasos de flores, baldes, barris, pneus usados e praticamente tudo que possa reter água tempo o bastante para o desenvolvimento das larvas. Tenho que dizer, no entanto, que isso tudo parece ser em vão. Os mosquitos continuam a se espalhar e os casos de dengue continuam a aumentar. O fato é que os mosquitos vão achar um lugar para porem seus ovos. Se eles não encontrarem no quintal, encontrarão na floresta ou num terreno baldio.

Em vez de forçá-los a porem os ovos onde não podemos ver, deveríamos estimulá-los a porem os ovos em torno de nós e então matar as larvas. Vários predadores aquáticos já foram testados como aliados potenciais, incluindo peixes larvívoros, ninfas de libélula, copépodes, planárias e até outros mosquitos cujas larvas comem larvas de Aedes! O uso destes predadores apresentou resultados diversos. Peixes larvívoros são difíceis de manter em tanques em casa e ninfas de libélula são generalistas demais como predadores.

Agora um novo predador foi sugerido: uma planta! Sim, uma planta carnívora do gênero Utricularia, que inclui espécies conhecidas em inglês como bladderworts. Em português costumam ser chamadas simplesmente de utriculárias. Estas plantas aquáticas possuem estruturas em forma de bexiga (bladder em inglês) que funcionam como armadilhas para capturar pequenos animais. A bexiga é oca e possui uma pressão interna negativa em relação ao ambiente que a envolve. Essa pressão negativa é criada por água sendo constantemente bombeada para fora da bexiga através das paredes por transporte ativo. A abertura da bexiga é coberta por uma pequena tampa que impede que a água a reencha quando a armadilha está armada. Em volta da tampa, há um grupo de protuberâncias em forma de cerdas. Quando um animal está se movendo pela água e move uma dessas cerdas, elas deformam a tampa ligeiramente, quebrando o selo e permitindo que água entre na bexiga. A pressão negativa então suga água rapidamente para dentro, arrastando o animal consigo. Aí é só questão de tempo para o pobre bichinho ser digerido.

Veja a planta em ação.

Um grupo de pesquisadores da Universidade de Rhode Island, EUA, testou se Utricularia macrorhiza, a utriculária-comum-norte-americana, poderia ser um predador eficiente de larvas de mosquitos. Adicionando U. macrorhiza a tanques com as larvas de A. aegypti e A. albopictus, eles conseguiram matar de 95 a 100% das larvas em apenas 5 dias. Esse é um ótimo resultado, não acham?

Utriculária com várias larvas de Aedes (marcadas com asteriscos) em suas armadilhas. Créditos a Couret et al. (2020).*

Como utriculárias são muito mais fáceis de criar em tanques e outros recipientes no quintal do que animais predadores como peixes e libélulas, elas são uma nova alternativa promissora para o controle das populações destes insetos transmissores de doenças.

Então, está animado em criar umas plantas carnívoras aquáticas para ajudar a combater esses mosquitos hediondos?

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Referências:

Couret J, Notarangelo M, Veera SLeClaire-Conway N, Ginsberg HS, LeBrun RL (2020) Biological control of Aedes mosquito larvae with carnivorous aquatic plant, Utricularia macrorhizaParasites Vectors 13, 208. https://doi.org/10.1186/s13071-020-04084-4

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição 4.0 Internacional.

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Arquivado em Botânica, Comportamento, Doenças, Entomologia, Parasitas, Vírus

Sexta Selvagem: Cigarra-Tinidora

por Piter Kehoma Boll

Há mais de 3 mil espécies de cigarra no mundo e elas são frequentemente associadas com o verão, quando se tornam adultas e seus cantos são ouvidos vindo das árvores. Hoje vou focar numa espécie australiana, Psaltoda claripennis, conhecida como em inglês como “clanger cicada”, nome que adaptei como “cigarra-tinidora”.

A cigarra-tinidora é encontrada no leste da Austrália e é comum em Brisbane e arredores, onde é facilmente vista em galhos de árvores, às vezes em grupos. Elas possuem um dorso amarronzado com alguns segmentos escuros, às vezes pretos, no abdome. O lado ventral é pálido, exceto pelo abdome, o qual é marrom, e as pernas, que são amarelas. Os olhos são vermelho-claros a vermelho-amarronzados e as asas são transparentes com nervuras verdes. Os machos medem cerca de 30 mm de comprimento e as fêmeas são ligeiramente menores, com cerca de 25 mm.

Macho (esquerda) e fêmea (direita) de cigarra-tinidora em Brisbane, Austrália. Extraído de brisbaneinsects.com.

Não consegui encontrar muita informação sobre sua história natural. Esta espécie na verdade era só mais uma entre muitas espécies de cigarra até alguns anos atrás quando uma descoberta interessante foi feita.

As asas de cigarras são estruturas lindas e geralmente são muito limpas. De fato, muitas espécies de insetos encontram formas de manter suas asas limpas mesmo em ambientes muito contaminados e uma das razões para isso é que asas de insetos são extremamente hidrofóbicas, isto é, elas repelem água da mesma forma que muitas folhas de plantas. Visto que a água tem dificuldade de se prender às asas, microrganismos associados à água também não conseguem chegar a elas.

Mas as asas da cigarra-tinidora são mais do que só hidrofóbicas. Estudos mostraram que cada célula de bactérias gram-negativas que acaba tocando a superfície da asa se deforma e morre. O mesmo não acontece com bactérias gram-positivas, no entanto. À medida que os estudos progrediram, os pesquisadores passaram a entender o arranjo estrutural das asas. A superfície delas é formada por pilares muito pequenos, com apenas 30 nm de altura, e distantes 170 nm um do outro. Quando uma bactéria gram-negativa cai nos pilares, suas membranas moles começam a escorregar para o espaço entre eles e se esticam o suficiente para romper. A pobre célula acaba como uma massa disforme e morta. Bactérias gram-positivas possuem paredes celulares mais rígidas e são resistentes ao esticamento, mas um tratamento com micro-ondas reduziu a rigidez e permitiu que elas também fossem mortas.

Nanoestrura da asa da cigarra-tinidora e representação de como uma bactéria morre ao tocá-la. Créditos a Pogodin et al. (2013).

Mais pesquisas sobre esta estrutura podem levar ao desenvolvimento de novos materiais que permanecem estéreis mesmo após contato com um patógeno.

Mais uma vez a diversidade de formas de vida nos trouxe maneiras de melhorar a sociedade. Quantas outras coisas úteis estão escondidas nas florestas e nos campos? Preservar os ecossistemas é o melhor para todos os habitantes deste planeta.

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Referências:

Xue F, Liu J, Guo L, Zhang L, Li Q (2015) Theoretical study on the bactericidal nature of nanopatterned surfaces. Journal of Theoretical Biology 385:1–7. https://doi.org/10.1016/j.jtbi.2015.08.011

Hasan J, Webb HK, Truong VK et al. (2013) Selective bactericidal activity of nanopatterned superhydrophobic cicada Psaltoda claripennis wing surfaces. Applied Microbiology and Biotechnologt 97:9257–9262. https://doi.org/10.1007/s00253-012-4628-5

Pogodin S, Hasan J, Baulin VA et.al. (2013) Biophysical Model of Bacterial Cell Interactions with Nanopatterned Cicada Wing Surfaces. Biophysical Journal 104(4): 835–840. https://doi.org/10.1016/j.bpj.2012.12.046

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Arquivado em Bactérias, Entomologia, Sexta Selvagem

Sexta Selvagem: Mariposa-Urso-Lanoso-do-Ártico

por Piter Kehoma Boll

Semana passada apresentei o salgueiro-ártico, um salgueiro incomum que vive como uma planta rasteira no Ártico e, como mencionei então, muitas espécies se alimentam dessa pequena planta. Uma destas espécies é Gynaeophora groenlandica, cujo nome popular em inglês ficaria, traduzido, mariposa-urso-lanoso-do-Ártico.

Como é comum entre lepidópteros, as lagartas da mariposa-urso-lanoso-do-Ártico se alimentam principalmente de uma só espécie, neste caso o salgueiro-ártico. Mas elas são muito mais que uma lagarta se alimentando de uma planta incomum.

Uma mariposa-urso-lanoso-do-Ártico sobre um salgueiro-ártico. Foto de Fiona Paton.*

Habitando a Groenlândia e as ilhas do Canadá, a mariposa-urso-lanoso-do-Ártico vive em um ambiente extremo no qual as temperaturas são muito baixas durante a maior parte do ano. Como resultado, ela é incapaz de se manter ativa durante vários meses e, como muitas espécies árticas, hiberna.

Na maior parte do mundo, a lagarta da mariposa-urso-lanoso-do-Ártico seria considerada de tamanho médio, mas em seu ambiente ela é um inseto relativamente grande. Seu corpo é coberto de pelos longos e macios que variam de um marrom-avermelhado a marrom-escuro. Os adultos possuem um cor acinzentada com um abdome piloso.

Um adulto esperando para acasalar. Foto do usuário pat_Lorch do iNaturalist.**

Os adultos acasalam e põem ovos no final de junho. Os ovos eclodem rapidamente e as pequenas larvas de primeiro ínstar começam a se alimentar das folhas do salgueiro-ártico, mas durante julho as temperaturas começam a cair rapidamente e a larva, ainda muito pequena, se prepara para hibernar. Elas tecem um hibernáculo de seda, um abrigo para hibernar, e entram em diapausa, permanecendo inativas até junho do ano seguinte. Quando a neve começa a derreter, elas acordam, começam a se alimentar de novo e fazem a muda, atingindo o segundo ínstar antes do fim de junho. Então elas tecem outro hibernáculo e entram em diapausa de novo. O ciclo continua pelos próximos anos até que atinjam o oitavo ano desde que eclodiram.

Uma lagarta acordando em seu hibernáculo. Foto do usuário pat_Lorch do iNaturalist.**

Neste ano, as lagartas se transformam em pupas, que se desenvolvem em adultos em cerca de uma semana. Os adultos então se acasalam, põem seus ovos, os ovos eclodem e as larvas de primeiro ínstar reiniciam o ciclo. Eclodindo no final de junho do primeiro ano e morrendo em meados de junho do oitavo ano, a mariposa-urso-lanoso-do-Ártico possui um ciclo de vida que se completa em cerca de 7 anos, mas é restrito a apenas três semanas por ano. Elas passam mais de 90% da vida como lagartas hibernando.

Dois adultos acasalando em junho. Foto do usuário pat_Lorch do iNaturalist.**

Não é fácil ser uma mariposa no Ártico. E a mariposa-urso-lanoso-do-Ártico não precisa sobreviver apenas aos invernos rigorosos mas também é ameaçada por parasitoides, porque todos sabemos que essas criaturas existem em todo lugar.

E com um ciclo de vida tão especializado, o que poderia acontecer com a mariposa-urso-lanoso-do-Ártico agora que as temperaturas do Ártico estão aumentando? Ela sobreviverá ao que fizemos com o clima da Terra?

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Referências:

Morewood WD, Ring RA (1998) Revision of the life history of the High Arctic moth Gynaephora groenlandica (Wocke) (Lepidoptera: Erebidae). Canadian Journal of Zoology 76:1371–1381.

Morewood DW, Wood MD (2002) Host utilization by Exorista thula Wood (sp. nov.) and Chetogena gelida (Coquillett) (Diptera: Tachinidae), parasitoids of arctic Gynaephora species (Lepidoptera: Lymantriidae). Polar Biology 25: 575–582. doi: 10.1007/s00300-002-0382-y

Wikipedia. Gynaephora gronelandica. Available at < https://en.wikipedia.org/wiki/Gynaephora_groenlandica >. Access on February 9, 2020.

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial Sem Derivações 4.0 Internacional.

**Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial e Compartilhamento Igual 4.0 Internacional.

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Sexta Selvagem: Vespa-Cuco-Avermelhada

por Piter Kehoma Boll

Além dos bem conhecidos parasitas internos e externos que se alimentam dos recursos do hospedeiro, a natureza possui também outros tipos de parasitismo. Um dos tipos é o chamado parasitismo de ninhada, no qual um animal põe seus ovos no ninho de outro animal de forma que eles serão criados por pais adotivos, geralmente de uma espécie diferente. Os cucos são certamente os parasitas de ninhada mais famosos, pondo ovos nos ninhos de outras aves.

Mas parasitas de ninhada existem também entre outros grupos animais, incluindo, é claro, a diversa ordem Hymenoptera. Vespas da família Chrysididae são conhecidas como vespas-cucos porque põem seus ovos nos ninhos de outras vespas. Uma espécie desta família é Hedychrum rutilans, que eu decidi chamar de vespa-cuco-avermelhada.

Uma vespa-cuco-avermelhada nos Países Baixos. Foto do usuário v_s_ do iNaturalist.*

Adultos desta espécie medem até 1 cm de comprimento e possuem um corpo com um formato que lembra uma formiga. Sua característica mais marcante, no entanto, é sua cor metálica que é típica de vespas-cucos. Na vespa-cuco-avermelhada, o abdome e a parte anterior do tórax possuem um tom avermelhado, enquanto o resto do corpo é um tanto verde.

Vivendo na Europa e nas regiões mais setentrionais da África, a vespa-cuco-avermelhada é uma adorável bebedora de néctar quando adulta. Todavia, como larva, é um parasitoide. As fêmeas põem seus ovos dentro de outro inseto para que as larvas se alimentem do hospedeiro a partir de dentro. Contudo, como eu mencionei, as vespas-cucos são parasitas de ninhada, de onde o nome vespa-cuco. Assim, elas não caçam outros insetos para servirem de hospedeiros para suas larvas. Em vez disso, invadem os ninhos de outra espécie, o lobo-de-abelha-europeu, apresentado aqui semana passada, e põem seus ovos nas abelhas que o lobo-de-abelha-europeu caçou para sua própria prole.

Vespa-cuco-avermelha na França. Foto do usuário butor do iNaturalist.*

Quando o ovo da vespa-cuco-avermelhada eclode, a larva começa a se alimentar das abelhas paralisadas e podem até mesmo se alimentar da larva do lobo-de-abelha. Mas como uma fêmea da vespa-cuco consegue invadir o ninho do lobo-de-abelha sem ser notada?

A superfície dos insetos é coberta de hidrocarbonetos cuticulares (CHCs), os quais possuem várias funções. Eles protegem o corpo da água e possuem muitas funções para comunicação química, tanto intra- quanto interespecífica. Parasitoides, por exemplo, fazem uso de sinais de CHC para encontrarem seus hospedeiros, e muitas espécies, especialmente insetos sociais como abelhas e formigas, usam CHCs para reconhecer indivíduos de sua própria colônia e detectar invasores, incluindo parasitoides e parasitas de ninhada. Assim, um lobo-de-abelha poderia facilmente localizar uma vespa-cuco se esgueirando para dentro de seu ninho, mas a seleção natural fez as mudanças necessárias. A quantidade de CHCs na superfície de vespas-cucos está bem abaixo dos níveis normais na maioria dos insetos. Como resultado, seu cheiro é tão fraco que elas não conseguem ser percebidas num ninho empestado de CHCs de lobo-de-abelha.

Um espécime na Rússia. Foto e Shamal Murza.*

Uma estratégia que lobos-de-abelha parecem ter desenvolvido para reduzir os níveis de parasitismo pela vespa-cuco-avermelhada é aumentar sua atividade no fim do dia, quando a atividade das vespas-cucos é reduzida. Durante esse tempo. é mais fácil para lobos-de-abelha entrarem em seus ninhos sem serem detectados pelas vespas-cucos. Quando um lobo-de-abelha detecta uma vespa-cuco perto de seu ninho, ele a ataca ferozmente. Contudo uma vez que a vespa-cuco tenha entrado no ninho, o lobo-de-abelha é incapaz de reconhecê-la mesmo se der de cara com ela lá dentro devido à inabilidade de detectar o invasor quimicamente.

Os dois lados, é claro, sempre tentarão encontrar novas maneiras de sucederem. Afinal, a natureza é uma corrida armamentista sem fim.

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Referências:

Kroiss J, Schmitt T, Strohm E (2009) Low level of cuticular hydrocarbons in a parasitoid of a solitary digger wasp and its potential for concealment. Entomological Science 12:9–16. doi: 10.1111/j.1479-8298.2009.00300.x

Kroiss J, Strohm E, Vandenbem C, Vigneron J-P (2009) An epicuticular multilayer reflector generates the iridescent coloration in chrysidid wasps (Hymenoptera, Chrysididae). Naturwissenschaften 983–986. doi: 10.1007/s00114-009-0553-6

Strohm E, Laurien-Kehnen C, Boron S (2001) Escape from parasitism: spatial and temporal strategies of a sphecid wasp against a specialised cuckoo wasp. Oecologia 129:50–57. doi: 10.1007/s004420100702

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Sexta Selvagem: Lobo-de-Abelha-Europeu

por Piter Kehoma Boll

Entre as espécies da altamente diversa ordem de insetos Hymenoptera, muitas são conhecidas por serem parasitas ou parasitoides de uma variedade de animais e plantas. Espécies parasitadas comumente conhecidas incluem aranhas e lagartas, mas alguns himenópteros parasitam outros himenópteros.

Um dessas espécies é Philanthus triangulum, conhecida como lobo-de-abelha-europeu. O nome lobo-de-abelha se refere ao fato de esta espécie caçar abelhas, particularmente a abelha-europeia-comum, Apis mellifera. Esta espécie ocorre através da Europa e da África, possuindo várias subespécies.

Um lobo-de-abelha-europeu fêmea em Gran Canaria, Espanha. Foto de Juan Emilio.**

O lobo-de-abelha-europeu possui cerca de o mesmo comprimento de sua presa, a abelha-europeia-comum, mas seu corpo possui um jeitão mais de vespa. O abdome e as pernas são predominantemente amarelos, enquanto a cabeça e o tórax são principalmente pretos e marrons. O abdome amarelo possui listras pretas transversais que são típicas de muitas espécies de vespas, mas sua largura pode variar. Os machos são menores que as fêmeas e possuem entre os olhos uma marca clara característica em forma de tridente que está ausente ou é muito pequena em fêmeas.

Um macho na Andaluzia, Espanha. Veja a marca em forma de tridente entre os olhos. Foto do usuário gailhampshire do flickr.*

Em regiões mais frias, onde o inverno é mais rigoroso, os lobos-de-abelha-europeus emergem como adultos no começo do verão. Tanto machos quanto fêmeas adultos se alimentam do néctar de várias plantas. As fêmeas criam grandes e muitas vezes complexas tocas em solos arenosos em locais abertos e ensolarados. As tocas podem ter até um metro de comprimento e possuem entre 3 e 24 túneis curtos, as câmaras da prole, no final, cada uma das quais será usada para criar uma larva. Uma vez terminando a toca, a fêmea procura por abelhas-europeias para caçar. Quando ataca a abelha, o fêmea de lobo-de-abelha a ferroa atrás das patas dianteiras e a paralisa, voando então de volta ao ninho e carregando a abelha paralisada abaixo de si entre as pernas. Até cinco abelhas podem ser fornecidas para cada larva e são sua única fonte de alimento durante seu desenvolvimento.

Uma fêmea com uma abelha parasitada na Inglaterra. Foto de Martin Cooper.*

Os machos tendem a viver perto das tocas das fêmeas e usam feromônios sexuais para atraí-las. Apesar de serem territoriais, eles às vezes toleram outros machos por perto porque isso aumenta a liberação de feromônios e assim aumenta as chances de serem detectados pelas fêmeas.

Após a fêmea fornecer alimento suficiente para cada ovo, ela fecha a toca e vai embora. Contudo, visto que as larvas permanecerão vários meses naquele ambiente fechado e úmido, elas podem acabar sofrendo com o crescimento de mofo que pode destruir a elas ou ao alimento. As fêmeas parecem ter desenvolvido várias estratégias para reduzir este problema. Primeiro, antes de pôr o ovo na abelha, a vespa lambe a maior parte da superfície da abelha, aplicando uma secreção de uma glândula pós-faríngea. Apesar de esta secreção não ter propriedades antimicóticas, ela parece reduzir a condensação de água no corpo da abelha, o que também retarda o desenvolvimento de fungos, e ao mesmo tempo previne a perda de água pelo corpo da abelha, garantindo que as larvas terão a quantidade de água necessária para sobreviverem.

Carregando uma abelha para a tocana Inglaterra. Foto de Charlie Jackson.*

As fêmeas do lobo-de-abelha-europeu vivem simbioticamente com bactérias do gênero Streptomyces que cultivam em glândulas especializadas nas antenas. Elas “secretam” as bactérias nas câmaras antes de irem embora e mais tarde, quando as larvas eclodem, elas coletam as bactérias e as aplicam na superfície de um casulo que constroem para passar o inverno. Estas bactérias previnem, assim, fungos e outras bactérias de crescerem no casulo, protegendo a larva de infecções.

A natureza nunca para de nos surpreender com estratégias maravilhosas e tão belamente construídas pela seleção natural.

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Referências:

Herzner G, Schmitt T, Peschke K, Hilpert A, Strohm E (2007) Food Wrapping with the Postpharyngeal Gland Secretion by Females of the European beewolf Philanthus triangulum.Journal of Chemical Ecology 33:849–859. doi: 10.1007/s10886-007-9263-8

Herzner G, Strohm E (2008) Food wrapping by females of the European Beewolf, Philanthus triangulum, retards water loss of larval provisions. Physiological Entomology 33:101–109. doi: 10.1111/j.1365-3032.2007.00603.x

Kaltenpoth M, Goettler W, Dale C, Stubblefield JW, Herzner G, Roeser-Mueller K, Strohm Erhard (2006) ‘Candidatus Streptomyces philanthi’, an endosymbiotic streptomycete in the antennae of Philanthus digger wasps. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology 56: 1403–1411. doi: 10.1099/ijs.0.64117-0

Wikipedia. European beewolf. Available at < https://en.wikipedia.org/wiki/European_beewolf >. Access on 20 February 2020.

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Sexta Selvagem: Joaninha-Vermelha

por Piter Kehoma Boll

Joaninhas são besouros famosos por seus corpos redondos e seus élitros com manchas mais ou menos circulares. Nem todas as espécies possuem manchas, no entanto, tal como Cycloneda sanguinea, a joaninha-vermelha.

Uma joaninha-vermelha macho na Flórida, EUA. Foto de Judy Gallagher.*

Ocorrendo dos Estados Unidos até a Argentina, a joaninha-vermelha é a joaninha mais disseminada na América do Sul. Seus élitros variam de laranja a vermelho intenso, enquanto o pronoto e a cabeça possuem a típica cor preta com marcas brancas que a maioria das joaninhas possui. Há uma pequena diferença entre machos e fêmeas. Os machos têm uma listra branca correndo através do meio da metade anterior do pronoto e a cabeça tem um quadrado branco na “testa”. Já as fêmea não possuem a listra branca no pronoto e possuem o quadrado branco atravessado por uma marca preta que o transforma em duas listras brancas.

Uma fêmea no Uruguai. Foto de Joaquín D.*

Após acasalar, a fêmea põe pequenos aglomerados de ovos amarelos na vegetação, os quais eclodem em larvas após cerca de 10 dias. A larva possui a típico aparência de uma larva de joaninha e o corpo em ínstares mais tardios possui uma cor cinza-escura com marcas amarelas. O tempo entre ovo e adulto varia muito dependendo da temperatura, com temperaturas mais altas acelerando o desenvolvimento. Assim, em climas quentes, a joaninha-vermelha pode ter mais de uma geração por ano.

Uma larva no México. Foto de Francisco Sarriols Sarabia.*

A joaninha-vermelha se alimenta principalmente de pulgões e, como muitas outras espécies de joaninha, é usada como controle biológico contra essas pragas em muitas plantações, como as de algodão, pinho, feijões e frutas cítricas. Ela é um predador voraz de pulgões tanto como larva quanto como adulto, e as fêmeas preferem pôr seus ovos em plantas que são infestadas por pulgões para garantir que sua prole tenha comida o bastante.

Um macho prestes a levantar voo na Califórnia, EUA. Foto do usuário ktsny do iNaturalist.*

Atualmente uma das principais ameaças à joaninha-vermelha é a joaninha-asiática, Harmonia axyridis, que foi deliberadamente introduzida em muitas áreas das Américas. Maior e mais agressiva, a joaninha-asiática exclui a joaninha-vermelha por competição, especialmente por comer seus ovos e larvas, mas também por consumir seu alimento, já que ambas possuem pulgões como presa principal.

Este é mais um exemplo de como controle biológico pode ser uma bela alternativa a espalhar veneno nas pragas, mas somente se conduzido sem introduzir um predador voraz em outro ecossistema.

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Referências:

Cardoso JT, Lázzar SMN (2003) Comparative biology of Cycloneda sanguinea (Linnaeus, 1763) and Hippodamia convergens Guérin-Méneville, 1842 (Coleoptera, Coccinellidae) focusing on the control of Cinara spp. (Hemiptera, Aphididae). Revista Brasileira de Entomologia 47(3): 443–446. doi: 10.1590/S0085-56262003000300014 

Işkıber AA (2005) Functional responses of two coccinellid predators, Scymnus levaillanti and Cycloneda sanguinea, to the cotton aphid, Aphis gossypii. Turkish Journal of Agriculture and Forestry 29: 347–355.

Michaud JP (2002) Invasion of the Florida Citrus Ecosystem by Harmonia axyridis (Coleoptera: Coccinellidae) and Asymmetric Competition with a Native Species, Cycloneda sanguinea. Environmental Entomology 31(5): 827–835. doi: 10.1603/0046-225X-31.5.827

Sarmento RA, Venzon M, Pallini A, Oliveira EE, Janssen A (2007) Use of odours by Cycloneda sanguinea to assess patch quality. Entomologia Experimentalis et Applicata 124(3): 313–318. doi: 10.1111/j.1570-7458.2007.00587.x

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial 4.0 Internacional

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Arquivado em Entomologia, Sexta Selvagem, Zoologia

Sexta Selvagem: Efêmera-Amarela

por Piter Kehoma Boll

Efêmeras constituiem a ordem Ephemeroptera, uma das mais antigas entre os insetos. Proximamente relacionadas às libélulas (ordem Odonata), efêmeras possuem uma ninfa aquática e uma imago (isto é, um adulto) terrestre. Uma espécie consideravelmente bem conhecida é Heptagenia sulphurea, comumente conhecida como efêmera-amarela.

Nativa da Europa, a efêmera-amarela vive a maior parte de sua vida como ninfa. Ela prefere águas correntes e limpas, onde vive sob pedras e se alimenta de matéria vegetal em decomposição e biofilmes de bactérias associados a esse material. A ninfa possui um corpo achatado e uma cor escura com várias marcas amareladas. As pernas são curtas e largas e possuem uma série de listras transversais sinuosas amarelas e pretas alternadas. Como em todas as ninfas de efêmera, o abdome possui brânquias visíveis em ambos os lados e três longos cercos (caudas) na ponta. Durante seu estágio final como ninfa, a efêmera-amarela mede cerca de 1 cm de comprimento.

Ninfa da efêmera amarela. Créditos a European Fly Angler.

A maioria das efêmeras são muito sensíveis à poluição e a efêmera-amarela é uma das mais sensíveis de todas, ao menos na Europa. Quando a água de um riacho começa a se tornar poluída, a efêmera-amarela é a primeira efêmera a desaparecer. Assim, sua presença indica água de qualidade muito boa.

Subimago fêmea na Rússia. Foto de Robin Bad.*

Diferente de todos os outros insetos, efêmeras possuem um estágio intermediário entre a ninfa e a imago, a chamada subimago. Este estágio já é terrestre como a imago e já possui asas, apesar de serem geralmente menos desenvolvidas, tornano-as má voadoras. O estágio de subimago na efêmera-amarela possui uma cor amarela típica, de onde o nome efêmera-amarela. As fêmeas possuem olhos pretos pouco desenvolvido, enquanto malhos possuem olhos maiores que variam de cinza-escuro a esbraquiçado. As ninfas se transformam em subimagos a partir de maio, quando o pico ocorre, mas podem aparecer até o final de julho.

Imago macho da efêmera-amarela na Rússia. Foto de Vladimir Bryukhov.*

Quando a subimago se transforma em adulto, geralmente após poucos dias, o corpo se torna marrom-claro e os olhos esbranquiçados em ambos os sexos, mas os olhos ainda são menores em fêmeas que em machos. Os adultos possuem somente a função de reproduzir e é o que fazem. Após acasalar, o macho morre em poucas horas, e assim acontece com a fêmea após pôr os ovos num riacho.

A efêmera-amarela é frequentemente usada como isca de pesca. Outrora uma espécie comum através da Europa, suas populações diminuíram consideravelmente no último século devido ao aumento de poluição da água. Alguns esforços recentes para despoluir riachos podem, felizmente, ajudar esta e outras espécies de efêmera a encontrarem novamente locais para proliferarem.

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Referências:

Beketov MA (2004) Different sensitivity of mayflies (Insecta, Ephemeroptera) to ammonia, nitrite and nitrate between experimental and observational data. Hydrobiologia 528:209–216.

Macan TT (1958) Descriptions of the nymphs of the British species of Heptagenia and Rhithrogena (Ephem.). Entomologist’s Gazette 9:83–92.

Madsen BL (1968) A comparative ecological investigation of two related mayfly nymphs. Hydrobiologia 31:3–4.

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial 4.0 Internacional

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Arquivado em Entomologia, Sexta Selvagem

Sexta Selvagem: Cigarrinha-de-Ponta-Preta

por Piter Kehoma Boll

A primeira espécie de 2020 é encontrada em florestas, jardins e plantações do sudeste e do leste da Ásia. Um membro do grupo de pequenos insetos conhecidos como cigarrinhas, seu nome científico é Bothrogonia ferruginea e seu nome comum em inglês é black-tipped leafhopper, o qual adaptei como cigarrinha-de-ponta-preta.

Cigarrinhas pertencem à ordem Hemiptera e se alimentam da seiva de várias plantas. A cigarrinha-de-ponta-preta mede um pouco mais de 1 cm de comprimento quando adulta. A cor dorsal é amarela, um pouco mais verde nas asas que na cabeça e no tórax, e há um grupo de manchas pretas na cabeça e no tórax, bem como uma margem preta na extremidade posterior das asas anteriores. Os olhos são pretos e as pernas também são amarelas, com áreas pretas nas articulações. Alguns espécimes podem ter um tom mais alaranjado, de onde o nome ferruginea (cor de ferrugem) deve ter vindo. O lado ventral é preto com uma borda amarela em cada segmento.

Bothrogonia ferruginea no Japão. Foto do usuário Keisotyo do Wikimedia.*

Os ovos são alongados, esverdeados e pequenos, e são postos em pequenos aglomerados na primavera. As ninfas de primeiro ínstar, que são pequenas e brancas, eclodem dos ovos após cerca de 8,5 dias. Elas se desenvolvem em adultos após cerca de 2 meses, passando por mais 4 ínstares de ninfa. Os adultos são imaturos de início e vivem 10 meses. Eles desenvolvem seus órgãos sexuais lentamente durante o verão e o outono, hibernam durante o inverno e acordam da hibernação na primavera prontos para acasalar.

Ninfa da cigarrinha-de-ponta-preta em Taiwan. Foto da usuária nicolle10 do iNaturalist.**

Cigarrinhas-de-ponta-preta machos prendem seu esperma a um material transparente que lembra uma corda e o transferem às fêmeas dentro de um grande espermatóforo que é depositado na bolsa copulatória. Parte do material dentro do espermatóforo parece ser transferido para dentro dos ovos, como se fosse um tipo de presente nutritivo do pai para seus futuros filhos.

Sugeriu-se que o peculiar padrão de coloração da cigarrinha-de-ponta-preta é uma forma de mimetismo. O fundo amarelo com manchas pretas lembra o padrão de coloração de pupas de joaninhas. Visto que joaninhas contêm algumas toxinas que as tornam uma refeição desagradável, imitá-las ajuda a cigarrinha-de-ponta-preta a ser evitada como alimento por muitos predadores.

Duas cigarrinhas-de-ponta-preta em Taiwan. Foto da usuária nicolle10 do iNaturalist.**

Como a cigarrinha-de-ponta-preta se alimenta de várias espécies de plantas, ela pode ser uma ameaça a alguns cultivares, especialmente uvas e chá. Mais que apenas se alimentar da seiva, a cigarrinha-de-ponta-preta pode ser um vetor para transmitir a bactéria Xylella fastidiosa entre plantas. Esta bactéria é responsável por muitas doenças, incluindo a doença de Pierce das uvas, que causa frutas enrugadas e queda prematura das folhas.

Felizmente a cigarrinha-de-ponta-preta (ainda) não é uma grande ameaça a nenhuma planta cultivada, de forma que não há urgência em estudar seu ciclo de vida em detalhes.

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Mais hemípteros:

Sexta Selvagem: Pulgão-da-Ervilha (em 12 de junho de 2015)

Sexta Selvagem: Maria-Fedida (em 10 de maio de 2019)

Sexta Selvagem: Soldadinho-Chifrudo-da-Acácia (em 23 de agosto de 2019)

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Referências:

Hayashi F, Kamimura Y (2002) The potential for incorporation of male derived proteins into developing eggs in the leafhopper Bothrogonia ferruginea. Journal of Insect Physiology, 48(2), 153–159. doi: 10.1016/s0022-1910(01)00159-7 

Tuan SJ, Hu FT, Chang HY, Chang PW, Chen YS, Huang TP (2016) Xylella fastidiosa transmission and life history of two cicaellinae sharpshooters, Kolla paulula and Bothrogonia ferruginea (Hemiptera: Cicadellidae), in Taiwan. Journal of Economic Entomology 109(3): 1034-1040. doi: 10.1093/jee/tow016

Yamazaki K (2010) Leafhopper’s face mimics the ladybird pupae. Current Science 98(4): 487–488.

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição e Compartilhamento Igual 4.0 Internacional.

**Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial 4.0 Internacional

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Sexta Selvagem: Mutuca-de-Hipopótamo

por Piter Kehoma Boll

Se você já viveu no interior ou visita o interior frequentemente, deve estar ciente da existência de um grupo incômodo de moscas que mordem humanos e outros animais, as chamadas mutucas, que compõem a família Tabanidae. A espécie de hoje é membro desta família e é cientificamente conhecida como Tabanus biguttatus e comumente pode ser chamada de mutuca-de-hipopótamo.

Esta espécie é encontrada através da África e algumas áreas do Oriente Médio, sendo, aparentemente, muito mais comum no leste e no sudeste da África. Como ocorre com todas as mutucas, a mutuca-de-hipopótamo possui uma larva semiaquática que vive em áreas lamacentas. Elas são predadores ferozes e predam outros animais vivendo no mesmo habitat, tal como larvas de tipulídeos, e podem se alimentar também de animais mortos. Quando as larvas estão prestes a empupar, elas constroem um cilindro de lama, o cobrem com uma tampa circular com apenas um pequeno buraco que as permita respirar, e permanecem ali até se tornarem adultos. Esta é, aparentemente, uma estratégia para evitar dessecação.

Mutuca-de-hipopótamo macho na África do Sul. Foto de Ryan Tippett.*

Mutucas-de-hipopótamo adultas medem cerca de 2 cm de comprimento, sendo mutucas relativamente grandes, e mostram um dimorfismo sexual considerável. Como ocorre em todos os tabanídeos, os machos são menores e possuem olhos compostos maiores que as fêmeas. Os olhos dos machos são tão grandes que tocam um ao outro, cobrindo todo o topo da cabeça. Fêmeas, por outro lado, possuem olhos menores com um espaço considerável entre eles. O corpo tanto do macho quanto da fêmea é predominantemente preto. Os machos possuem duas manchas triangulares brancas no abdome enquanto as fêmeas possuem o tórax coberto de pelos que variam de branco a dourado com uma pequena mancha preta em forma de coração no meio.

Mutuca-de-hipopótamo fêmea na África do Sul. Créditos à usuária bdwright do iNaturalist.*

Mutucas-de-hipopótamo machos adultas são inofensivas e se alimentam apenas de néctar. Fêmeas, por outro lado, precisam de sangue de mamíferos para conseguirem proteína suficiente para o desenvolvimento dos ovos. Elas atacam muitas espécies de mamíferos de grande porte, incluindo humanos, gado e até cães, mas possuem uma forte preferência por hipopótamos, de onde o nome comum.

Duas mutucas-de-hipopótamo fêmeas se alimentando num facocero-do-sul (Phacochoerus africanus spp. sundevallii). Foto do usuário happyasacupake do iNaturalist.*

Mutucas-de-hipopótamo, como todos os tabanídeos, são moscas diurnas e amam locais ensolarados. Elas evitam áreas sombreadas, então animais em áreas abertas são muito mais vulneráveis. Para conseguir sangue, uma fêmea se aproxima dos animais e lhes corta a pele com suas peças bucais afiadas, fazedo-os sangrarem e lambendo o sangue. A mordida é muito dolorida, como você deve saber se já foi picado por uma mutuca. Se não é perturbada, a mosca pode ficar até três minutos bebendo sangue.

Close das duas moscas nas costas do facocero. Foto do usuário happyasacupake do iNaturalist.*

A atividade de beber sangue das mutucas-de-hipopótamo fêmeas, e de tabanídeos em geral, as torna prováveis vetores mecânicos de alguns parasitas, incluindo espécies do gênero de flagelados Tripanossoma, bem como Bacillus anthracis, a bactéria que causa o antraz, uma doença consideravelmente comum em hipopótamos.

Mutucas-de-hipopótamo são um incômodo tão grande para hipopótamos que o comportamento deles é altamente afetado pela presença das moscas, muito mais que presença de qualquer predador de grande porte. Muitas vezes os hipopótamos permanecem na água unicamente para se livrarem destes insetos irritantes.

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Mais dípteros:

Sexta Selvagem: Mosca-doméstica (em 12 de outubro de 2012)

Sexta Selvagem: Mosca-abelha-fofa (em 29 de julho de 2016)

Sexta Selvagem: Mosquinha-do-banheiro (em 5 de abril de 2019)

Sexta Selvagem: Mosquito-de-remo-azul (em 27 de setembro de 2019)

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Referências:

Callan EM (1980) Larval feeding habits of Tabanus biguttatus and Amanella emergens in South Africa (Diptera: Tabanidae). Revue de Zoologie Africaine 94(4): 791-794.

Tinley KL (2009) Some observations on certain tabanid flies in North-Eastern Zululand (Diptera: Tabanidae). Proceedings of the Royal Entomological Society of London. Series A, General Entomology, 39(4-6), 73–75. doi: 10.1111/j.1365-3032.1964.tb00789.x

Tremlett JG (2009) Mud cylinders formed by larvae of Tabanus biguttatus Wied. (Diptera: Tabanidae) in Kenya. Proceedings of the Royal Entomological Society of London. Series A, General Entomology, 39(1-3), 23–24. doi: 10.1111/j.1365-3032.1964.tb00779.x

Wiesenhütter E (1975) Research into the relative importance of Tabanidae (Diptera) in mechanical disease transmission. Journal of Natural History, 9(4), 385–392. doi: 10.1080/00222937500770281 

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial 4.0 Internacional

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