Arquivo do mês: abril 2018

Sexta Selvagem: Ferrugem-da-Pera

por Piter Kehoma Boll

Lindo e mortal, o camarada de hoje aparece durante a primavera como projeções gelatinosas de cor laranja saindo de juníperos na Europa e na América do Norte. Seu nome é Gymnosporangium sabinae, comumente conhecido como a ferrugem-da-pera.

As chifres gelatinosos da ferrugem-da-pera num junípero. Foto de Mark Sadowski.*

A ferrugem-da-pera é um basidiomiceto, isto é, um fungo do filo Basidiomycota, portanto relacionado com os cogumelos comuns, mas pertencendo a uma classe diferente, Puccioniomycetes.

Durante o inverno, a ferrugem-da-pera permanece num estado dormente dentro dos ramos de juníperos. Depois de dias úmidos na primavera, o fungo brota e aparece como crescimentos semelhantes a chifres cobertos por uma massa laranja gelatinosa e chamados de télios. Os télios produzem esporos que podem ser carregados pelo vento e infectam pereiras.

A ferrugem-da-pera em folhas de uma pereira. Foto de Jan Homann.

Uma vez que atinjam a pereira, os teliósporos germinam e infectam as folhas do novo hospedeiro. A infecção aparece no verão como manchas com cor de ferrugem nas folhas, de onde vem o nome ferrugem-da-pera. Em plantas com infecções grandes, os efeitos da ferrugem-da-pera podem ser severos, às vezes fazendo a planta perder todas as suas folhas.

Em pereiras, o fungo produz estruturas reprodutivas chamadas écios. Eles saem da parte inferior das folhas e produzem esporos chamados eciósporos, os quais podem infectar novos juníperos.

Écios saindo da ferrugem em uma pereira. Foto de H. Krisp.**

Devido à importância econômica das pereiras a humanos, a ferrugem-da-pera é uma espécie de grande preocupação. Alguns países possuem políticas para reduzir a disseminação da doença, como a prevenção de transporte de juníperos de áreas conhecidas por terem o fungo para áreas onde ele não é conhecido. Em áreas onde o fungo existe, as soluções para reduzir o dano incluem o uso de fungicidas químicos, a remoção de ramos infectados em juníperos e às vezes a remoção de qualquer junípero ao redor das áreas onde pereiras são cultivadas.

– – –

Referências:

Fraiture, A.; Vanderweyen, A. (2011) Gymnosporangium sabinae: such a beautifiul disease. Scripta Botanica Belgica 11: 193–194.

Ormrod, D. J.; O’Reilly, H. J.; van der Kamp, B. J,; Borno, C. (1984) Epidemiology, cultivar susceptibility, and chemical control of Gymnosporangium fuscum in British Columbia. Canadian Journal of Plant Pahology6: 63–70.

Wikipedia. Gymnosporangium sabinae. Disponível e, < https://en.wikipedia.org/wiki/Gymnosporangium_sabinae >. Acesso em 27 de abril de 2018.

– – –

*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição e Compartilhamento Igual 2.0 Genérica.

**Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição 3.0 Não Adaptada.

1 comentário

Arquivado em Fungos, Parasitas, Sexta Selvagem

Sexta Selvagem: C. elegans

por Piter Kehoma Boll

Apesar do seu pesqueno tamanho, o camarada de hoje é um dos organismos mais importantes na pesquisa científica atual. Com o nome de Caenorhabditis elegans e geralmente chamado simplesmente de C. elegans, este verme é um nematódeo e atinge cerca de 1 mm de comprimento e vive no solo em áreas temperadas.

Um hermafrodita adulto de C. elegans. Foto de Bob Goldstein.**

Há apenas quatro feixes de músculos correndo ao longo do corpo do C. elegans e eles só permitem que o verme se curve dorsal ou ventralmente, mas não lateralmente. Assim, ao se mover por uma superfície horizontal, os vermes são forçados a ficarem deitados sobre o lado esquerdo ou direito.

A principal fonte de alimento do C. elegans são bactérias que se alimentam de matéria orgânica em decomposição, apesar de eles também poderem se alimentar de algumas espécies de leveduras. Como resultado eles proliferam em solos ricos em matéria orgânica, onde bactérias ocorrem em abundância.

O sexo do C. elegans é incomum. Um organismo adulto pode ser ou macho ou hermafrodita, sem formas que sejam fêmeas puras. Os hermafroditas são a forma mais comum e geralmente se autofertilizam, apesar de poderem, e aparentemente preferirem, acasalar com machos. As larvas passam por quatro estágios larvais antes de se tornarem adultos, mas isso acontece muito rapidamente, visto que, em condições ideais, o tempo de vida do C. elegans é de cerca de 2 a 3 semanas. Contudo, em condições em que não há comida suficiente, um terceiro estágio larval alternativo chamado dauer pode se formar. O estágio dauer possui o corpo todo selado, incluindo a boca, o que o impede de ingerir alimento, e pode permanecer assim por alguns meses até que as condições estejam boas novamente.

Como a maioria dos nematódeos, o C. elegans apresenta eutelia, isto é, o verme adulto possui um número de células geneticamente determinado no corpo. Este número é fixo e não muda, pois a divisão celular para de ocorrer em adultos. C. elegans machos possuem 1031 células e hermafroditas possuem 959 células.

Devido ao seu pequeno tamanho, número de células pequeno e fixo, corpo transparente e facilidade de ser criado em laboratório, o C. elegans se tornou o organismo-modelo perfeito. Ele foi o primeiro organismo a ter seu genoma inteiramente sequenciado e é o único organismo com um conectoma (mapa das conexões neuronais) completo. Ele vem sendo usado em estudos sobre envelhecimento, desenvolvimento, apoptose e todo tipo de expressão de genes.

– – –

Curta nossa página no Facebook!

Siga-me (@piterkeo) no Twitter!

– – –

Referências e leitura adicional:

Brenner, S. (1974) The genetics of Caenorhabditis elegans. Genetics 77(1): 71-94.

Klass, M. R. (1977) Aging in the nematode Caenorhabditis elegans: Major biological and environmental factors influencing life span. Mechanisms of Ageing and Development 6: 413–429. https://doi.org/10.1016/0047-6374(77)90043-4

Peden, E.; Killian, D. J.; Xue, D. (2008) Cell death specification in C. elegans. Cell Cycle 7(16): 2479–2484. https://doi.org/10.4161/cc.7.16.6479

Wikipedia. Carnorhabditis elegans. Disponível em< https://en.wikipedia.org/wiki/Caenorhabditis_elegans >. Acesso em 16 de abril 2018.

– – –

**Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição e Compartilhamento Igual 3.0 Não Adaptada.

1 comentário

Arquivado em Sexta Selvagem, vermes, Zoologia

Quarta de Quem: Eduard von Martens

por Piter Kehoma Boll

Hoje é o 187º aniversário do zoólogo alemão Carl Eduard von Martens.

Nascido em Stuttgard em 18 de abril de 1831, von Martens tinha três irmãs mais velhas. Seu pai era conselheiro no Serviço Civil de Würtemburg, mas é mais conhecido como um explorador da Fauna e da Flora do sul da Alemanha. Como tanto seu pai quanto suas irmãs mostravam grande interesse no mundo natural, von Martens seguiu seus passos e desde uma tenra idade se interessou em coletar e estudar conchas. Na escola, ele sempre foi um aluno impressionante e mostrava pouco interesse em brincar com os outros meninos, preferindo dedicar seu tempo à sua paixão por conchas.

Mais tarde, ele foi a Tübingen e estudou medicina na universidade local. Sob os ensinamentos de Hugo von Mohl (1805–1872) e Friedrich August von Quenstedt (1809–1889), von Martens expandiu seus estudos em história natural e se tornou particularmente interessado na estrutura e distribuição de animais no espaço e no tempo. Após se graduar em 1855, ele se mudou para Berlim, atraído pela fama de Johannes Peter Müller (1801–1858). Após voltar de uma excursão de férias à Noruega com Müller, von Martens foi chamado ao Museu Zoológico de Berlim (atualmente o Museu de História Natural de Berlim) que naquela época era dirigido por Hinrich Lichtenstein (1780–1857). A partir de 1859, von Martens se tornou ligado à instituição, ficando responsável pela divisão de invertebrados (excluindo insetos). Sob seus cuidados, a coleção de moluscos cresceu enormemente, tornando-se uma das maiores no mundo até o presente.

Em 1860, von Martens embarcou na expedição Thetis do governo prússio para a Ásia Oriental, ficando com a expedição até 1862. Quando o navio retornou à Europa, ele permaneceu dois anos a mais na Ásia e estudou intensivamente a fauna local, especialmente os moluscos das Ilhas Sunda e Molucas.

Carl Eduard von Martens, cerca de 1901.

Durante sua carreira, von Martens descreveu quase 1800 espécies animais, das quais 1680 eram moluscos, tornando-se assim um dos nomes mais influentes da malacologia.

Ele morreu em 14 de agosto de 1904, aos 73 anos, deixando a esposa e uma filha, bem como uma contribuição imensurável à biologia.

– – –

Referências:

Wikipedia. Eduard von Martens. Disponível em <
https://en.wikipedia.org/wiki/Eduard_von_Martens >. Acessso em 17 de abril de 2019.

1 comentário

Arquivado em Biografias

Sexta Selvagem: Musgo-Quadridentado-Pelúcido

por Piter Kehoma Boll

É hora de voltar aos pequeninos, os musgos. A terceira espécie do grupo a ser apresentada aqui se chama Tetraphis pellucida ou o musgo-quadridentado-pelúcido. Encontrado no hemisfério norte, este musgo é comum em florestas decíduas e cresce quase exclusivamente sobre a madeira em decomposição de coníferas.

A aparência geral do musgo-quadridentado-pelúcido sobre um tronco em decomposição. Foto de Hermann Schachner.

O musgo-quadridentado-pelúcido pode ter dois modos diferentes de reprodução: sexuada e assexuada. A reprodução sexuada ocorre de forma similar à encontrada na maioria dos musgos. A assexuada, no entanto, é um tanto peculiar e acontece através da produção de propágulos chamados gemas. As gemas podem ocorrer ao longo de um talo, sendo chamadas de gemas de talo, ou dentro de um copo formado por três a cinco folhas grandes, uma estrutura chamada conceptáculo. As gemas tanto de talo quanto de conceptáculo são propelidas pela força de gotas de chuva. O que é interessante é que o tipo de estrutura das gemas parece relacionado à inclinação da superfície em que o musgo cresce. De uma superfície horizontal até uma com uma inclinação de cerca de 18°, conceptáculos são mais comuns, possivelmente porque as gotas de água caindo dentro do conceptáculo propelem as gemas com grande velocidade para cima. Em superfícies com inclinação acima de 18°, talos são mais comuns, já que um conceptáculo caído de lado não seria muito útil, e a água pode arrastar gemas de talos mais facilmente.

Uma olhada mais de perto de vários conceptáculos. Foto de Hermann Schachner.

Em relação à dispersão, os esporos da reprodução sexuada parecem capazes de se mover para mais longe da mãe, mas não são tão bem-sucedidos em germinar e ocupar um novo substrato quanto as gemas. Assim, os diferentes modos de reprodução parecem ajudar esse incrível musguinho a se espalhar pelos mais locais adequados em cada situação.

No entanto quando outras espécies de musgo chegam no substrato, o musgo-quadridentado-pelúcido é rapidamente substituído por elas. Ele tem, portanto, um baixo sucesso ao competir com outras espécies. Como ele pode ser uma das espécies mais comuns em seu habitat então? Bem, é assim porque os propágulos (gemas) do musgo-quadridentado pelúcido o permitem colonizar rapidamente substratos recém formados, os quais surgem de distúrbios comuns no solo da floresta. Nenhuma outra espécie consegue colonizar tão depressa, mas como as outras conseguem facilmente expulsar nosso camaradinha, existe uma luta sem sim para sobreviver. O musgo-quadridentado-pelúcido depende de distúrbios para seguir em frente.

– – –

Curta nossa página no Facebook!

Siga-me (@piterkeo) no Twitter!

– – –

Referências:

Kimmerer, R. W. (1991) Reproductive ecology of Tetraphis pellucida. I. Population density and reproductive mode. The Bryologist 94(3): 255-260. https://doi.org/10.2307/3243962

Kimmerer, R. W. (1991) Reproductive ecology of Tetraphis pellucida. II. Differential Success of Sexual and Asexual Propagules. The Bryologist 94(3): 284–288. https://doi.org/10.2307/3243966

Kimmerer, R. W. (1993) Disturbance and dominance in Tetraphis pellucida: a model of disturbance frequency and reproductive mode. The Bryologist 96(1): 73-79. https://doi.org/10.2307/3243322

– – –

1 comentário

Arquivado em Botânica, Sexta Selvagem