Arquivo da categoria: moluscos

Revelados os gostos da língua-de-vaca! Planária gigante é encontrada comendo caracol gigante!

por Piter Kehoma Boll

Polycladus gayi é uma planária terrestre icônica encontrada no Chile e conhecida localmente como lengua de vaca (língua de vaca). Apesar de ser a maior planária terrestre do chile e uma das primeiras planárias terrestres descritas, ainda em 1845, não sabemos quase nada de sua ecologia.

Mas as coisas estão mudando! Nos últimos meses, dois espécimes foram encontrados se alimentando na na natureza e, em ambos os casos, a presa era a mesma espécie, o caracol negro gigante, Macrocyclis peruvianus, o maior caracol do Chile. Ambas as observações ocorreram em áreas de proteção do Chile, Parque Nacional Villarrica e Parque Nacional Alerce Costero, e foram registradas por pessoas não especialistas visitando as áreas. Mais uma descoberta importante que aconteceu graças à ciência cidadã!

A planária terrestre Polycladus gayi agarrada ao caracol Macrocyclis peruvianus e se banqueteando em sua carne. Foto de Yerko Lloncón.*

Após quase dois séculos desde que a planária P. gayi foi descoberta, finalmente sabemos algo sobre sua posição na cadeia alimentar! E, claro, isso também nos ajuda a ver o caracol M. peruvianus de uma nova perspectiva, já que esse também parece ser o primeiro registro de um de seus predadores! Apesar de caracóis serem um item comum na dieta de planárias terrestres, nem todas as espécies se alimentam deles, e não podemos supor que ambos os grupos estão sempre diretamente conectados na teia alimentar.

Vem ver como a planária ficou gordinha depois de comer o caracol inteiro!

Ainda há muito para descobrir sobre essas duas criaturas chilenas tão únicas, e a parceria entre pesquisadores e o público em geral é uma forma importante de acelerar o acúmulo de conhecimento sobre as criaturas ao nosso redor!


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Referências:

Boll PK, Lloncón Y, Almendras D (2023) Records of the land planarian Polycladus gayi (Tricladida, Geoplanidae) preying on black snails Macrocyclis peruvianus (Gastropoda, Macrocyclidae). Austral Ecology. https://doi.org/10.1111/aec.13430


*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição Não Comercial e Compartilhamento Igual 4.0 Internacional.

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Arquivado em Comportamento, Ecologia, moluscos, platelmintos

Sexta Selvagem: Pleurobrânquio-Multicor

por Piter Kehoma Boll

[read it in English]

Algumas espécies são tão peculiares e fofas que parecem Pokémon da vida real (bem, ao menos com os Pokémon das primeiras gerações). Uma dessas espécies é Berthella martensi, o pleurobrânquio-multicor.

Um espécime branco com manchas escuras na Austrália. Foto de Steve Smith.*

Vivendo no Indo-Pacífico desde a zona entre-marés até uma profundidade de cerca de 25 m, o pleurobrânquio-multicor mede cerca de 5 a 6 cm de comprimento quando adulto e é frequentemente encontrado em lagunas rasas de recifes de corais. Os pleurobrânquios são um grupo de lesmas marinhas com uma brânquia externa localizada no lado direito do corpo, contrastando com os mais famosos nudibrânquios que possuem a brânquia no dorso.

Um dos padrões de cor mais típico do pleurobrânquio-multicor. Foto de Karen (usuário kswt do iNaturalist).*

O pleurobrânquio-multicor possui um manto proeminente que se estende na forma de grandes lobos cobrindo o corpo, incluindo a brânquia. Esses lobos podem ser autotomizados se o animal se sentir ameaçado, de forma que pode escapar e deixar o predador para trás com um lanchinho para se distrair. Mas o pleurobrânquio-multicor é um predador também, alimentando-se de esponjas e, de acordo com algumas fontes, também de ascídias.

Um espécime com todos os seus lobos do manto autotomizados. O pé é claramente visível, bem como a brânquia do lado direito (mostrada com zoom no canto interior esquerdo). Créditos a W. B. Rudman. Extraído de http://www.seaslugforum.net/factsheet/defauto.
Um espécime se alimentando de uma esponja em Palawan, Filipinas. Foto de Alain Bonnet. Extraído de http://www.seaslugforum.net/find/17244

Mas certamente uma das características mais marcantes do pleurobrânquio-multicor é a variedade de padrões de coloração que a espécie apresenta. Ele pode ter uma cor quase branca, creme-claro, ou ser roxo-escuro, quase preto, com várias cores intermediárias, como amarelo, laranja, vermelho ou cinza-arroxeado. Além da cor de fundo, frequentemente há várias manchas de uma cor mais clara em animais escuros e mais escura em animais claros. Espécimes com cor de fundo clara também podem ter uma margem escura nos lobos do manto, geralmente da mesma cor das manchas, apesar de isso nem sempre estar presente. Em animais escuros a margem sempre tem a mesma cor do fundo.

Um indivíduo escuro da Papua-Nova Guiné. Foto de Erik Schlogl.*

Apesar de sua beleza e fofura, o pleurobrânquio-multicor é mais uma espécie cuja ecologia é quase completamente desconhecida por nós. Mesmo tendo esse jeito carismático, ninguém se importou em conhecê-lo melhor até agora.

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Referências:

Rudman, W.B., 1998 (October 28) Berthella martensi (Pilsbry, 1896). [In] Sea Slug Forum. Australian Museum, Sydney. Disponível em http://www.seaslugforum.net/find/bertmart

Yonow, N. (2015). Sea Slugs: unexpected biodiversity and distribution. In The Red Sea (pp. 531-550). Springer, Berlin, Heidelberg. https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-3-662-45201-1_30

Wikipedia. Berthella martensi. Disponível em https://en.wikipedia.org/wiki/Berthella_martensi. Acesso em 1 de dezembro de 2022.

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Sexta Selvagem: Dente-de-Elefante-Comum

por Piter Kehoma Boll

Moluscos compreendem o filo animal mais especioso depois dos artrópodes, mas somente três de suas classes são populares entre o público geral. Uma das classes menos conhecida é Scaphopoda, que inclui um grupo de moluscos conhecidos como dentes-de-elefante. Entre as cerca de 500 espécies descritas, uma é chamada Antalis entalis, ou o dente-de-elefante-comum.

O dente-de-elefante-comum é encontrado em águas do Atlântico Norte e, como todos os dentes-de-elefante, passa a maior parte da vida enterrado nos sedimentos no fundo do mar. Seu corpo mede cerca de 4 cm de comprimento e é rodeado por uma concha alongada que possui uma abertura em cada extremidade, uma sendo mais estreita que a outra. A abertura mais larga é a pela qual ele estende seu pé e uma série de tentáculos pequenos conhecidos como captáculos. Os dentes-de-elefante não possuem olho algum, ao menos como adultos. Suas larvas de vida livre possuem um breve estágio no qual olhos muito simples ocorrem.

Fundo preto com duas conchas brancas com o formato aproximado de uma presa de elefante, cônicas e alongadas, mais largas numa extremidade que na outra. Numa delas se vê uma pequena protuberância cilíndrica curta e coberta de pequenos tentáculos que parecem filamentos saindo do lado maior.
A maior parte do corpo do dente-de-elefante-comum é permanentemente rodeado pela concha. Só seu pé e os minúsculos tentáculos, os captáculos, se estendem através da abertura maior como visto na primeira concha da imagem.

Devido à estranha anatomia dos dentes-de-elefante, é difícil dizer qual parte do corpo é a extremidade anterior ou posterior, ou qual é o dorso e qual é o ventre, mas a abertura maior é frequentemente considerada o lado ventral ou a extremidade anterior. A abertura mais estreita na outra ponta da concha é direcionada para cima e é usada principalmente para a respiração. A água entra através dessa abertura, trazendo oxigênio, e sai levando o dióxido de carbono embora.

Como dentes-de-elefante adultos nunca deixam os sedimentos voluntariamente, eles se alimentam de outros organismos que vivem no mesmo substrato. Foraminíferos compreendem boa parte de sua dieta. Eles usam os captáculos para capturar e ingerir as presas e eliminam as fezes pelo ânus, que se localiza na mesma abertura maior da concha.

Apesar de cerca de 500 espécies viventes de dentes-de-elefante terem sido descritas, sabemos muito pouco sobre sua ecologia e é até difícil encontrarmos fotos de espécimes vivos. O dente-de-elefante-comum é uma das espécies mais estudadas, mas esses estudos estão relacionados à sua anatomia, distribuição e desenvolvimento embrionário, além de estudos filogenéticos. A importância dos dentes-de-elefante para os ecossistemas marinhos é em grande parte desconhecida.

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Referências:

Antalis entalis (Linnaeus, 1758) in GBIF Secretariat (2021). GBIF Backbone Taxonomy. Checklist dataset https://doi.org/10.15468/39omei accessed via GBIF.org on 2022-07-28.

Reynolds, P. D. (2002). The scaphopoda. Advances in marine biology42, 137-236. https://doi.org/10.1016/S0065-2881(02)42014-7

Wollesen, T., McDougall, C., & Arendt, D. (2019). Remnants of ancestral larval eyes in an eyeless mollusk? Molecular characterization of photoreceptors in the scaphopod Antalis entalisEvoDevo10(1), 1-12. https://doi.org/10.1186/s13227-019-0140-7

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Sexta Selvagem: Ostra-de-Água-Doce-Africana

por Piter Kehoma Boll

Ostra é um termo usado para uma variedade de bivalves não relacionados entre si. Apesar de a maioria das ostras ocorrer no mar, há bivalves com jeitão de ostra em ambientes de água-doce também. Uma dessas ostras de água doce é Etheria elliptica, conhecida como ostra-de-água-doce-africana.

Como seu nome comum sugere, a ostra-de-água-doce-africana é encontrada na África, incluindo o continente em si e Madagascar. Ela é, de fato, a única ostra de água doce na África e a única espécie no gênero Etheria. Ela é distribuída através da maioria das grandes bacias hidrográficas da África, incluindo as dos rios Nilo, Níger, Volta e Congo, e de Madagascar.

Várias conchas cimentadas da ostra-de-água-doce-africana em Angola. Não é nenhuma vencedora de concurso de miss. Foto de Rob Palmer.*

A aparência externa da ostra-de-água-doce-africana não é das mais bonitas. Sendo um bivalve meio que oval, essa espécie começa a vida com duas conchas de tamanho e formato idênticos, o que é uma característica típica de bivalves da subclasse Palaeoheterodonta. No entanto a ostra-de-água-doce-africana se deita com uma das conchas sobre substratos duros e esta concha começa a encrustar no substrato, se tormando fortemente presa, cimentada a ele, tornando o animal séssil e assimétrico. A superfície da concha também se torna muito erodida, desgastada, em um período muito curto, o que lhe dá o aspecto irregular clássico que vemos nas ostras marinhas verdadeiras. Este é, talvez, o motivo de elas serem chamadas de ostras também.

Superfície interna (acima) e externa (abaixo) de uma concha recém-coletada na Serra Leoa. Foto do usuário benbarca do iNaturalist.**

Enquanto o lado de fora é meio feio, a superfície interna da ostra-de-água-doce-africana geralmente tem o belo aspecto iridescente que a maioria das conchas de molusco tem, a qual é causada pela presença de nácar ou madrepérola.

Como a maioria dos bivalves, a ostra-de-água-doce-africana é uma espécie primariamente dioica, com indivíduos machos e fêmeas. No entanto hermafroditas não são tão raros e parecem ter gônadas completamente funcionais. Detalhes de sua reprodução não são bem conhecidos ainda, aparentemente.

Sendo uma espécie comestível, a ostra-de-água-doce-africana é uma fonte importante de alimento para muitas populações humanas na África, às vezes sendo a principal fonte de proteína e frequentemente a principal fonte de renda de muitas famílias. As ostras são frequentemente coletadas por mulheres quando o nível dos rios está baixo e as colônias ficam expostas acima da superfície da água. Ferramentas como enxadas e martelos são usados para arrancas as ostras do substrato. Enquanto essa exploração de subsistência é essencial para muitas pessoas, as populações da ostra estão sofrendo superexploração em muitas áreas. Em Madagascar, por exemplo, as populações foram tão intensamente exploradas que a espécie quase se tornou extinta lá, e há evidências sugerindo que outros lugares estão seguindo para o mesmo caminho desastroso.

As ostras são fáceis de localizar quando o nível do rio está baixo, como podemos ver aqui no Rio Volta Branco em Gana. Extraído de Ampofo-Yeboah & Owusu-Frimpong (2014).

Apesar de ser considerada uma só espécie no momento, alguns resultados moleculares preliminares indicam a existência de pelo menos três espécies diferentes só na Bacia do Congo. Isso sugere que populações mais isoladas, em diferentes bacias hidrográficas, podem na verdade constituir espécies distintas também. Assim, algumas podem já ter sido extintas sem nosso conhecimento, como nas dizimadas populações de Madagascar.

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Mais bivalves:

Sexta Selvagem: Mexilhão-Marrom (em 17 de novembro de 2017)

Sexta Selvagem: Amêijoa-Gigante (em 14 de setembro de 2018)

Sexta Selvagem: Amêijoa-Asiática (em 14 de fevereiro de 2020)

Sexta Selvagem: Ostra-Espinhosa-Gigante (em 30 de outubro de 2020)

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Referências:

Akélé, G. D., Agadjihouèdé, H., Mensah, G. A., & Lalèyè, P. A. (2015). Population dynamics of freshwater oyster Etheria elliptica (Bivalvia: Etheriidae) in the Pendjari River (Benin-Western Africa). Knowledge and Management of Aquatic Ecosystems, (416), 06. https://www.kmae-journal.org/articles/kmae/abs/2015/01/kmae140100/kmae140100.html

Ampofo-Yeboah, A., & Owusu-Frimpong, M. (2014). The Fishery of the Freshwater Oyster Etheria Elliptica (Etheriidae) in Northern Ghana: Its Distribution and Economic Importance. Journal of Agriculture and Sustainability5(2). https://www.infinitypress.info/index.php/jas/article/view/774

Ampofo-Yeboah, A., Owusu-Frimpong, M., & Yankson, K. (2009). Gonad development in the freshwater oyster Etheria elliptica (Bivalvia: Etheriidae) in northern Ghana. African Journal of Aquatic Science34(2), 195-200. https://doi.org/10.2989/AJAS.2009.34.2.11.898

Elderkin, C. L., Clewing, C., Wembo Ndeo, O., & Albrecht, C. (2016). Molecular phylogeny and DNA barcoding confirm cryptic species in the African freshwater oyster Etheria elliptica Lamarck, 1807 (Bivalvia: Etheriidae). Biological Journal of the Linnean Society118(2), 369-381. https://doi.org/10.1111/bij.12734

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*Creative Commons License Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons de Atribuição e Compartilhamento Igual 4.0 Internacional.

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Sexta Selvagem: Lesma-Lixa-Tropical

por Piter Kehoma Boll

Gastrópodes apresentam uma diversidade impressionante de formas, ficando em segundo lugar somente para os insetos. Um dos grupos mais diversos dentro deles é o dos gastrópodes pulmonados, mas nem todos os gastrópodes pulmonados realmente possuem pulmões. É o caso das chamadas lesmas-lixas, uma das famílias mais peculiares de pulmonados.

Entre as lesmas-lixas, uma das espécies mais bem-conhecidas é Laevicaulis alte, conhecida como a lesma-lixa-tropical (tropical leatherleaf em inglês). Esta espécie é nativa da África tropical e, como todas as lesmas-lixas, não possui pulmões e tem o ânus localizado na extremidade posterior do corpo, diferente da maioria dos gastrópodes pulmonados no qual ele é curvado para a frente. Lesmas-lixas-tropicais adultas medem cerca de 8 cm de comprimento e seu lado dorsal é completamente coberto pelo manto, que possui uma pele tuberculada escura, quase preta, com uma linha central bege. Os tentáculos são pequenos e muito raramente se estendem além dos limites do manto, de forma que raramente são vistos de cima. O pé, a linha ventral com a qual as lesmas se movem, é muito estreita, tendo apenas de 4 a 5 mm de largura em adultos.

Um espécime andando à noite em Moçambique. Foto do usuário i_c_riddell do iNaturalist**.

Como a maioria dos gastrópodes, a lesma-lixa-tropical é hermafrodita, mas ela começa sua vida sexual como macho e mais tarde se transforma em fêmea. Ela é bem adaptada a condições secas, tendo um dorso coriáceo e um pé estreito que reduzem a perda de água. Além disso, ela pode se contrair em uma forma menor e mais arredondada que reduz a superfície corporal.

A dieta da lesma-lixa-tropical em seu ambiente nativo é desconhecida. Vivendo na serapilheira, ela provavelmente se alimenta de matéria vegetal em decomposição e ervas pequenas. Contudo ela foi acidentalmente introduzida em muitas áreas tropicais pelo mundo, especialmente na Austrália e ilhas do Pacífico pelo entorno, incluindo Taiwan, Havaí, Fiji, Nova Caledônia e Samoa, bem como na Índia e na Indonésia. Lá, ela pode se tornar uma praga séria para algumas plantações, como tomates, pepinos e espinafre.

Um espécie em Taiwan. Foto de Beren Tofino.*

Mais que uma praga para as plantações, esta lesma pode servir como hospedeiro intermediário para o nematódeo Angiostrongylus cantonensis, que causa meningite eosinofílica em humanos e outros animais. Esta é, portanto, mais uma espécie que costumava ser inocente em seu habitat nativo, mas se tornou uma vilã por causa de ações humanas.

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Referências:

Brodie, G. D., & Barker, G. M. (2012). Factsheet Laevicaulis alte (Ferussac, 1822). http://repository.usp.ac.fj/5436/1/Laevicaulis_alte-_Ferussac-1822.pdf

Wikipedia. Laevicaulis alte. Available at < https://en.wikipedia.org/wiki/Laevicaulis_alte >. Access on 24 June 2021.

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As aventuras taxonômicas de Ernst e Eveline

por Piter Kehoma Boll

Os zoólogos alemães radicados no Brasil, Ernst Marcus e Eveline Du Bois-Reymond Marcus foram importantes figuras do século XX e descreveram inúmeras espécies novas da fauna brasileira e de outros países da América do Sul. Eles faziam do exercício de dar nomes às espécies uma verdadeira diversão. Vem conhecer brevemente a história deles e alguns dos nomes curiosos que eles elaboraram, incluindo a imortalização de uma pisada que uma amiga deu no cachorro deles!

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Sexta Selvagem: Caracol-Gigante-Africano

por Piter Kehoma Boll

Alguns dias atrás eu vi uma foto de alguns caracóis-gigantes-africanos e pensei “essa é uma espécie interessante para aparecer na Sexta Selvagem” e, para minha surpresa, um gastrópode estava programado para hoje, então voilà, vamos falar de Lissachatina fulica, o caracol-gigante-africano.

Como o nome popular sugere, este caracol é nativo da África, mais precisamente do leste da África, lá pelos lados do Quênia e da Tanzânia, e é bem grande, com os adultos chegando a medir 20 cm ou mais de comprimento e cerca de 7 cm de altura. A concha é cônica e muito dura e tem uma cor marmorada marrom e branca e uma borda afiada na abertura.

Um caracol-gigante-africano em Zanzibar. Foto de  Jean-Paul Boerekamps*.

O caracol-gigante-africano consegue se alimentar de uma enorme variedade de plantas e às vezes pode comer até animais mortos, papel e pedras. Como resultado, ele é muito adaptável a novas áreas e se tornou uma invasor em muitas regiões do mundo, especialmente em áreas tropicais da Ásia, da América do Sul e do Pacífico.

Esses caracóis são hermafroditas, mas quando acasalam podem agir apenas como machos, apenas como fêmeas ou como ambos, e isso é geralmente relacionado ao tamanho dos dois caracóis envolvidos. Se eles têm tamanho similar, transferem esperma de um para o outro. Se têm tamanhos diferentes, o menor age como macho e o maior como fêmea. O caracol “agindo como fêmea” pode armazenar esperma por até dois anos para fertilizar os ovos que produz. Assim, uma única “fêmea” acasalada pode criar uma população inteira se for transportada para uma área nova, já que ela pode pôr até 200 ovos por postura e produzir cerca de 5 ou 6 posturas por ano.

Um indivíduo jovem no Havaí. Foto de Scott Loarie.

O caracol-gigante-africano é comestível e usado como alimento por alguns povos africanos. Uma espécie similar, Archachatina marginata, nativa da Nigéria, é dada como oferenda a divindades da África Ocidental, as quais no Brasil deram origem ao Candomblé. Contudo como essa espécie não é encontrada no Brasil, é substituída pela Lissachatina fulica, que foi introduzida nesse país.

Recentemente o caracol-gigante-africano se tornou consideravelmente popular como animal de estimação também. A espécie também tem sido estudada para uso medicinal e um composto antimicrobiano foi isolado de seu muco.

Especialmente devido ao seu uso como fonte de alimento, mas também acidentalmente, o caracol-gigante-africano foi introduzido em muitos lugares do mundo e se tornou uma ameaça a ecossistemas tropicais por causa de seu comportamento voraz, onde compete com caracóis nativos por alimento. Devido à necessidade de se alimentar de cálcio para construir sua concha, esses caracóis podem acabar comendo materiais ricos em cálcio em construções e causar danos severos às estruturas.

Um espécime em Salvador, Brasil. Foto de Clara Matos.**

Mais do que isso, o caracol-gigante-africano pode hospedar um nematódeo parasita, Angiostrongylus cantonensis, que causa uma meningite muito séria em humanos. A maioria dos casos de humanos sendo infectados por este nematódeo é resultado de comerem os caracóis crus, mas há uma pequena chance de se infectar só de manipular os caracóis.

Devido a tantos efeitos danosos da introdução dessa espécie ao redor do planeta, ela é considerada uma das 100 piores espécies invasoras do mundo. Algumas tentativas de controlar populações invasoras usando agentes biológicos falharam miseravelmente e só pioraram todo o cenário. Semana que vem apresentarei uma dessas falhas.

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Referências:

Graeff-Teixeira, C. (2007). Expansion of Achatina fulica in Brazil and potential increased risk for angiostrongyliasis. Transactions of the Royal Society of Tropical Medicine and Hygiene101(8), 743-744. https://doi.org/10.1016/j.trstmh.2007.03.012

Thiengo, S. C., Faraco, F. A., Salgado, N. C., Cowie, R. H., & Fernandez, M. A. (2007). Rapid spread of an invasive snail in South America: the giant African snail, Achatina fulica, in Brasil. Biological Invasions9(6), 693-702.

Wikipedia. Achatina fulica. Available at < https://en.wikipedia.org/wiki/Achatina_fulica >. Access on 24 February 2021.

Zhong, J., Wang, W., Yang, X., Yan, X., & Liu, R. (2013). A novel cysteine-rich antimicrobial peptide from the mucus of the snail of Achatina fulica. Peptides39, 1-5. https://doi.org/10.1016/j.peptides.2012.09.001

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Sexta Selvagem: Ostra-Espinhosa-Gigante

por Piter Kehoma Boll

Sempre fico chocado ao descobrir que alguma espécie bonita e aparentemente bem conhecida ainda é quase completamente não pesquisada. E hoje novamente temos uma espécie assim aqui.

Spondylus varius, a ostra-espinhosa-gigante, é um grande molusco bivalve encontrado na região do Indo-Pacífico, especialmente pela Indonésia e para o norte até o Japão. Ela chega a 20 cm de tamanho, sendo a maior espécie do gênero Spondylus, conhecidas como ostras-espinhosas.

Uma ostra gigante espinhosa perto de Mayotte no Oceano Índico. Foto de Frédéric Ducarme.*

Apesar do nome, as ostras-espinhosas não são proximamente relacionadas às ostras verdadeiras, mas são mais próximas das vieiras e das amêijoas. Não obstante, elas são capazes de produzir pérolas, apesar de isso ser raro. O adjetivo “espinhosas” se refere ao fato de a concha ter várias projeções que lembram espinhos.

A concha de uma ostra-espinhosa-gigante adulta é quase inteiramente branca, mas a prodissoconcha (a parte mais basal de cada valva, que é lisa) tem uma cor que varia de vermelho-carmim a amarelo. Isso é mais facilmente visto em uma concha limpa de um espécime morto. Espécimes vivos ficam presos ao substrato e suas conchas são quase sempre cobertas por outras formas de vida sésseis.

Várias conchas limpas de ostra-espinhosa-gigante mostrando sua cor brnaca com uma prodissoconcha variando de marim a amarelo. Foto do usuário Amada44 do Wikimedia.**

A borda do manto, visível na beirada da concha quando está aberta, tem muitos tentáculos laranjas a amarelos, bem como muitos olhos tal como as vieiras, apesar de eles não serem tão facilmente percebidos. A franja do manto tem uma cor azul-acinzentada com manchas brancas e pretas de diferentes tamanhos e uma borda amarela.

A ostra-espinhosa-gigante é comestível e é frequentemente consumida em Okinawa. Uma sopa feita dela é considerada um medicamento para manter a função hepática, e um estudo revelou que alguns extratos desta espécie possuem um efeito protetor no intestino, sugerindo que seu uso tradicional tem fundamento.

Infelizmente não encontrei estudos ecológicos sobre a ostra-espinhosa-gigante. Que maravilhas este belo bivalve pode estar escondendo? Há tantas espécies para serem estudadas e tão poucas pessoas e ainda menos fundos para garantir tais estudos.

Precisamos de um mundo mais científico. E matar Trump e Bolsonaro seria uma maneira maravilhosa de começar a se mover em direção a esse objetivo =)

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Referências:

Koyama T, Chounan R, Uemura D, Yamaguchi K, Yazawa K (2006) Hepatoprotective Effect of a Hot-Water Extract from the Edible Thorny Oyster Spondylus varius on Carbon Tetrachloride-Induced Liver Injury in Mice. Bioscience, Biotechnology, and Biochemistry 70(3): 729-731. https://doi.org/10.1271/bbb.70.729

Wikipedia. Spondylus. Available at <https://en.wikipedia.org/wiki/Spondylus>. Access on 29 October 2020.

Wikipedia. Spondylus varius. Available at <https://en.wikipedia.org/wiki/Spondylus_varius>. Access on 29 October 2020.

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Sexta Selvagem: Anjo-do-Mar-Comum

por Piter Kehoma Boll

Semana passada apresentei um belo caramujo marinho, a borboleta-do-mar-comum, com seus longos parapódios como asas que lhes permitem nadar. As borboletas-do-mar pertencem a um grupo de gastrópodes marinhos conhecidos como Pteropoda devido a este pé modificado em nadadeiras. Há dois grupos principais de pterópodes, Thecosomata, que possuem concha, e Gymnosomata, que não possuem concha. Enquanto os com concha são chamados de borboletas-do-mar, os sem concha são chamados de anjos-do-mar ou borboletas-do-mar-nuas.

O anjo-do-mar mais popular é Clione limacina, o anjo-do-mar-comum. Seu corpo é em grande parte transparente e, como todos os pterópodes, possui dois parapódios que se parecem com asas e que, junto com o corpo alongado e sem concha, o fazem parecer de fato um anjo. Apesar dessa aparência angelical, o anjo-do-mar-comum é uma criatura terrível.

Apesar da aparência serena, encontrar este belo gastrópode pode ser uma experiência assustadora. Foto de Kevin Raskoff, Hidden Ocean 2005 Expedition: NOAA Office of Ocean Exploration.

Sendo um predador, o anjo-do-mar-comum é especializado em comer a borboleta-do-mar-comum. Ambas as espécies compartilham o mesmo ambiente em águas árticas e sua associação é conhecida há séculos. A forma como o anjo-do-mar-comum captura e come a borboleta-do-mar-comum é impressionante e meio assustadora.

Um espécime, que foi trazido até a praia, em uma mão humana para comparação. Foto do usuário nbenson do iNaturalist.*

Quando um anjo-do-mar detecta uma borboleta-do-mar por perto, ele começa uma perseguição e everte seis cones bucais adesivos da boca, formando uma estrutura em forma de cesto. Essa estrutura é usada para capturar a borboleta-do-mar e, uma vez que o pobre caramujo está preso, o anjo-do-mar gira a concha da borboleta-do-mar até a abertura estar direcionada para a boca do predador.

Depois disso, o terror começa. A pobre borboleta-do-mar já se encolheu toda na concha a essa hora, mas o anjo-do-mar usa um grupo de ganchos quitinosos na boca para perfurar o corpo da borboleta-do-mar e, com ajuda da rádula, puxa o corpo inteiro da presa de dentro da concha, comendo-a toda de uma vez. É provavelmente uma morte horrível para a pobre borboleta-do-mar. Após terminar de engolir a borboleta-do-mar, o anjo-do-mar-comum pode ir atrás da próxima em cerca de dois minutos.

Desenho de um anjo-do-mar-comum se alimentando de uma borboleta do mar comum. BC = cones bucais, HK = ganchos quitinosos, S = a concha da borboleta-do-mar. Extraído de Lalli (1970).

Enquanto o ciclo de vida da borboleta-do-mar-comum é curto, durando só um ano, o do anjo-do-mar-comum é muito mais longo. Como resultado, não há borboletas-do-mar adultas para servirem de alimento para o anjo-do-mar-comum do final do outono até o começo da primavera. Por muito tempo se pensou que o anjo-do-mar-comum passaria esse tempo todo sem comer, e de fato se descobriu que ele pode sobreviver longos períodos de inanição. Contudo análises do conteúdo estomacal do anjo-do-mar-comum revelaram a presença de anfípodes e eventualmente copépodes calanoides, sugerindo que ele possa contar com algumas fontes alternativas de comida em casos de extrema necessidade. Seu alimento principal, contudo, é a borboleta-do-mar-comum sem dúvidas. Eles começam a se alimentar delas quando ainda são larvas, sempre capturando e ingerindo borboletas-do-mar que possuem um tamanho similar ao deles.

Será que o anjo-do-mar-comum conseguirá sobreviver com estas outras presas se as populações da borboleta-do-mar-comum diminuírem com as mudanças climáticas? Acho improvável, e espero que não precisemos chegar ao ponto em que isso se torne uma opção.

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Referências:

Böer M, Graeve M, Kattner G (2006) Exceptional long-term starvation ability and sites of lipid storage of the Arctic pteropod Clione limacina. Polar Biology 30:571–580. doi: 10.1007/s00300-006-0214-6

Conover RJ, Lalli CM (1972) Feeding and growth in Clione limacina (Phipps), a pteropod mollusc. Journal of Experimental Marine Biology and Ecology 9(3):279–302. doi: 10.1016/0022-0981(72)90038-X

Kallevik IHF (2013) Alternative prey choice in the pteropod Clione limacina (Gastropoda) studied by DNA-based methods. Master thesis in Biology, The Arctic University of Norway.

Lalli CM (1970) Structure and function of the buccal apparatus of Clione limacina (Phipps) with a review of feeding in gymnosomatous pteropods. Journal of Experimental Marine Biology and Ecology 4(2):101–118. doi: 10.1016/0022-0981(70)90018-3

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Sexta Sevagem: Borboleta-do-Mar-Comum

por Piter Kehoma Boll

As pessoas amam nomear criaturas marinhas fazendo analogias com coisas encontradas em terra. A espécie de hoje é mais uma desse tipo, sendo a mais bem conhecida espécie das chamadas borboletas-do-mar e, portanto, conhecida como a borboleta-do-mar-comum. Ela não tem nada a ver com borboletas, no entanto, e seu nome científico, Limacina helicina, a descreve melhor.

A borboleta-do-mar-comum é um molusco, mais precisamente um gastrópode e, como tem concha, é um “caramujo”. Ela não se arrasta pelo fundo como a maioria dos caramujos, no entanto. Com uma concha espiral medindo somente 10 mm de diâmetro em média, ela vive na coluna d’água e às vezes é descrita como uma espécie planctônica. Ela pode nadar por conta própria, no entanto, porque seu pé carnoso é transformado em duas expansões chamadas parapódios que agem como duas grandes nadadeiras. Sua concha é transparente e as partes moles são principalmente roxas, apesar de os parapódios serem quase transparentes também.

A borboleta-do-mar-comum é mesmo uma criatura linda, não é? Foto de Russ Hopcroft, University of Alaska, Fairbanks.

O habitat da borboleta-do-mar-comum inclui as águas frias da região ártica, incluindo o Oceano Ártico e áreas vizinhas dos oceanos Pacífico e Atlântico. No Pacífico, ela pode ocorrer para o sul até o Japão e regiões mais ao norte dos Estados Unidos. Espécimes maiores tendem a habitar águas mais profundas, até 150 m de profundidade, enquanto os menores vivem mais perto da superfície, até uma profundidade de 50 m. Até bem recentemente, pensava-se que a borboleta-do-mar-comum também habitasse águas antárticas, mas estudos moleculares revelaram que as populações em torno da Antártica pertencem a outra espécie, Limacina antarctica.

Veja como elas conseguem bater suas asas com velocidade,

A dieta da borboleta-do-mar-comum inclui várias criaturas planctônicas menores, especialmente crustáceos pequenos, como náuplios (larvas) de copépodes, bem como dinoflagelados, ciliados e diatomáceas. Juvenis da própria espécie também são comuns, às vezes compondo o segundo item mais comum da dieta. Para capturar a comida, elas produzem uma teia esférica de muco que flutua acima delas na água. Esta teia captura outros organismos na coluna d’água e depois é sugada e comida pela borboleta-do-mar junto com as criaturas capturadas. Esta teia é muito difícil de ser observada durante o dia por causa da refração difusa, mas aparece claramente à noite. Quando perturbada por luz, no entanto, a borboleta-do-mar-comum tende a engolir sua teia rapidamente e afundar para escapar do perigo.

Uma borboleta-do-mar-comum com sua teia de muco esférica vista como uma concentração coval de partículas mais finas logo acima dela. Extraído de Gilmer & Harbinson (1986).

A fina concha da borboleta-do-mar-comum é constituída de aragonita, a qual é altamente solúvel e sensível a mudanças na temperatura e na acidificação da água. Estudos demonstraram que o esperado aumento da acidificação dos oceanos pelas mudanças climáticas induzidas por humanos provavelmente terá um impacto negativo em populações da borboleta-do-mar-comum e espécies relacionadas. Isso é particularmente preocupante em relação à borboleta-do-mar-comum porque ela é uma espécie-chave nos ecossistemas árticos, sendo uma fonte de alimento importante para muitos animais marinhos, como peixes, baleias, aves e até outros moluscos.

Esse caramujinho não vai se dar por vencido tão facilmente, no entanto. Estudos mostraram que o periostraco (a camada externa orgânica da concha) pode impedir que a aragonita se dissolva e que um trauma físico que quebre o periostraco, permitindo contato direto da aragonita com a água, é necessário para causar a dissolução. E mesmo quando isso acontece, a borboleta-do-mar-comum pode compensar construindo novas camadas de aragonita na superfície interna da concha e consegue extrair aragonita da água para esse propósito mesmo quando os níveis na água estão muito baixos.

A borboleta-do-mar-comum é pequena mas também é durona.

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Referências:

Corneau S, Alliouane S, Gattuso JP (2012) Effects of ocean acidification on overwintering juvenile Arctic pteropods Limacina helicina. Marine Ecology Progress Series 456:279–284. doi: 10.3354/meps09696

Comeau S, Jeffree R, Teyssié JL, Gattuso JP (2010) Response of the Arctic pteropod Limacina helicina to projected future environmental conditions. PLoS One 5(6):e11362. doi: 10.1371/journal.pone.0011362

Gilmer RW, Harbinson GR (1986) Morphology and field behavior of pteropod molluscs: feeding methods in the families Cavoliniidae, Limacinidae and Peraclididae (Gastropoda: Thecosomata). Marine Biology 91:47–57. doi: 10.1007/BF00397570

Gilmer RW, Harbinson GR (1991) Diet of Limacina helicina (Gastropoda: Thecosomata) in Arctic waters in midsummer. Marine Ecology Progress Series 77:125–134.

Lischka S, Büdenbender J, Boxhammer T, Riebesell U (2011) Impact of ocean acidification and elevated temperatures on early juveniles of the polar shelled pteropod Limacina helicina: mortality, shell degradation, and shell growth.  Biogeosciences 8:919–932. doi: 10.5194/bg-8-919-2011

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