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As mudanças climáticas provavelmente devastarão os ecossistemas de cavernas

por Piter Kehoma Boll

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Estamos bem cientes dos efeitos drásticos que o aumento da temperatura média no planeta está tendo e terá sobre os ecossistemas. A acidez dos oceanos está aumentando e causando problemas a espécies com esqueletos de carbonato de cálcio. O derretimento das calotas de gelo polares destroi o habitat de espécies polares e aumenta os níveis dos oceanos, inundando áreas de terra baixas e destruindo ainda mais ecossistemas. Mas esses problemas têm a ver principalmente com espécies que vivem nos oceanos ou na superfície dos continentes.

Cavernas são ecossistemas subterrâneos que abrigam uma diversidade impressionante, incluindo muitas linhagens únicas que foram extintas na superfície muito tempo atrás. Visto que muitas cavernas são pequenas e não diretamente conectadas a outras cavernas, espécies nesses habitats tendem a ser altamente endêmicas. Não é incomum encontrar espécies vivendo numa só caverna com uma população bem pequena. Já apresentei aqui alguns casos assim antes relacionados a planárias.

Mas hoje falaremos de outro carinha de caverna, Proasellus lusitanicus, um pequeno isópode medindo até 8 mm de comprimento que é endêmico do sistema cárstico de Estremenho em Portugal. Não tendo olhos nem pigmentação, este minúsculo isópode é completamente adaptado à vida nas cavernas, e a água na qual ele vive possui uma temperatura relativamente constante de cerca de 17 °C o ano todo. Contudo o aumento da temperatura global média na superfície do planeta pode causar um aumento na temperatura da água dentro das cavernas também.

Proasellus lusitanicus na Caverna Almonda, Portugal. Créditos a Di Lorenzo & Reboleira (2022).*

Para entender como P. lusitanicus lidaria com um aumento da temperatura da água, as pesquisadoras Tiziana di Lorenzo e Ana Sofia Reboleira levaram espécimes ao laboratório e monitoraram sua resposta a temperaturas entre 17 e 22.5 °C, incluindo o consumo de oxigênio. Os resultados não foram muito bons. Nossos pequenos isópodes mostraram uma redução drástica na respiração com um aumento de só alguns graus na temperatura. A 22.5 °C, eles consumiram 75% menos oxigênio que a 17 °C. De fato, 25% dos espécimes morreram quando a temperatura da água aumentou apenas 2.5 °C.

Cavernas geralmente possuem condiç]oes muito estáveis, com pequena variação na luz, temperatura e umidade ao longo do ano. Como resultado, muitas espécies, como P. lusitanicus, perderam a habilidade de tolerar uma ampla gama de condições. Se a temperatura da água no sistema cárstico de Estremenho aumentar só alguns graus por causa das mudanças climáticas, nosso pequeno isópode provavelmente será extinto. Mas ele não será o único. A maioria, se não todas, as espécies de caverna são similarmente sensíveis a mudanças e podem ter o mesmo fim trágico.

Agora um local rico em espécies incríveis, as cavernas podem acabar como uma terra devastada em breve devido à inabilidade humana de tomar conta do planeta.

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Referência:

Di Lorenzo, T., & Reboleira, A. S. P. (2022). Thermal acclimation and metabolic scaling of a groundwater asellid in the climate change scenario. Scientific Reports12(1), 17938. https://www.nature.com/articles/s41598-022-20891-4

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Arquivado em Conservação, crustáceos